O Projeto LeishNão

Este é um projeto de extensão desenvolvido por professores e acadêmicos dos cursos de Veterinária, Enfermagem, Ciências Biológicas, Medicina e outros cursos de saúde da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. Nosso foco é a educação em saúde para a prevenção e controle da leishmaniose visceral humana e canina mato Grosso do Sul.

segunda-feira, 28 de outubro de 2013

LeishNão: O alvo da prevenção é você!




Leishmaniose Visceral - contexto epidemiológico e Projeto LeishNão

Das doenças negligenciadas junto à Organização Mundial de Saúde - doenças associadas à situação de pobreza, precárias condições de vida e iniquidades em saúde e mais prevalentes nos países em desenvolvimento - as leishmanioses estão entre as seis endemias prioritárias no mundo. A leishmaniose visceral ocorre em quase todos os continentes - Ásia, África, Europa, Américas. Estima-se que a leishmaniose visceral (LV) infecta 500.000 pessoas por ano, e mata aproximadamente 51.000 (WHO, 2011a), e é de caráter endêmico em pelo menos 80 países do mundo. Cerca de 90% dos casos de LV ocorrem em cinco países: Bangladesh, Índia, Nepal, Sudão e Brasil (WHO, 2011b; WHO, 2012). É uma zoonose causada por protozoários do gênero Leishmania, sendo veiculada através de vetores flebotomíneos. No Brasil, a LV é uma doença endêmica causada por Leishmania chagasi, cujo vetor principal é Lutzomyia longipalpis (ACHA e SZYFRES, 2003; DESJEUX, 2004; BRASIL, 2006).

O primeiro relato de leishmaniose na América do Sul foi descrito por Migone em 1913 em um paciente paraguaio vindo de Porto Esperança, Mato Grosso do Sul (MIGNONE, 1913). No Brasil a doença foi inicialmente reportada por Chagas em 1937 como uma doença esporádica, de caráter silvestre e sem evidências da relação do cão como reservatório, e ao longo do tempo passou por uma marcada alteração em sua epidemiologia: ultrapassou dos limites do meio rural alcançando os centros urbanos. A urbanização da doença é resultado de mudanças ambientais causadas pela migração, desmatamento e adaptação do vetor ao ambiente urbano (BRASIL, 2006). A dificuldade de controle da doença em centros urbanos está associada a baixos investimentos em saúde, desnutrição, falta de saneamento básico e descontinuidade das ações de controle (GONTIJO e MELO, 2004).

Quanto à incidência no território nacional, 70% do total de casos são registrados na região Nordeste, seguido das regiões Sudeste, Norte e Centro-Oeste. A ocorrência restrita a áreas rurais e pequenas localidades urbanas já não é mais uma realidade, sendo notificados atualmente surtos epidêmicos em grandes centros urbanos como Corumbá (MS), Três Lagoas (MS), Campo Grande (MS), Belo Horizonte (MG), Araçatuba (SP), Palmas (TO), Várzea Grande e Cuiabá (MT), o que torna a LV uma doença em grande fase de urbanização (HUEB et al., 2000; BEVILACQUA et al., 2001;CAMARGO-NEVES, 2004; VINHAL e DOMINGOS, 2005; OLIVEIRA et al., 2006; MARCELINO, 2007).

Na região Centro-Oeste, o Estado de Mato Grosso do Sul apresenta o maior número de casos notificados, seguido de Goiás e de Mato Grosso, que tem apresentado, ao longo dos anos, uma tendência crescente de casos (BRASIL, 2006). Em Mato Grosso do Sul inicialmente a LV esteve restrita à região oeste – Corumbá e Ladário – e a partir de 1995 a doença atingiu outros municípios como Três Lagoas, Anastácio, Campo Grande e Bodoquena. Em Campo Grande o primeiro isolamento de Leishmania chagasi em cães ocorreu em 1998 e os primeiros casos humanos foram notificados em 2002 (SILVA, ANDREOTTI e HONNER, 2007; OLIVEIRA et al., 2006; CORTADA et al., 2004; NUNES et al., 2001). A expansão da LV em Mato Grosso do Sul coincidiu com a construção do gasoduto Bolívia-Brasil, no sentido oeste para leste, assim os municípios de Corumbá, Miranda, Aquidauana, Anastácio, Campo Grande, Ribas do Rio Pardo e Três Lagoas foram a principal rota de disseminação, assim como a degradação do cerrado é um fator importante a se considerar (ANTONIALLI et al., 2006). Em Campo Grande, a construção de avenidas acompanhando o curso dos rios e a construção de casas em locais onde havia vegetação são alguns fatores importantes (SILVA, ANDREOTTI e HONNER, 2007).

A epidemiologia da leishmaniose visceral acompanha marcadamente fatores geográfico-ambientais que favoreceram a urbanização do vetor e, por conseguinte, da doença. Estudos em epidemiologia moderna e de planejamento, monitoramento e vigilância têm utilizado os sistemas de informação geográfica (SIG), uma poderosa ferramenta para melhorar o entendimento de dados através da análise e visualização. Os SIGs podem ser descritos como uma extensão de análise estatística que funde dados epidemiológicos, sociais, clínicos e econômicos ao espaço, utilizando um computador, gerando imagens dos eventos avaliados. Um SIG não cria dados, mas os relaciona usando um sistema de referências que descrevem relações espaciais. Métodos de análise espacial estão sendo incorporados a sistemas de decisão espacial para a saúde pública como, por exemplo, o uso de SIG e a análise espacial de dados para o estabelecimento de relações entre taxas de doença e exposição à fatores ambientais, gerando mapas temáticos de fácil visualização e interpretação. As etapas de análise de dados inseridos em um SIG são denominadas geoprocessamento e existem diversos métodos de análise disponíveis, assim como grande variedade de softwares privados ou livres (RICKETTS, 2003; RUSHTON, 2003).

Utilizando ferramentas de SIG foram elaborados mapas temáticos levando em consideração a incidência da LV nos anos de 2007 a 2011 com dados disponibilizados pelo Lacen-MS. Através dos mapas foi possível observar que o bairro Aero Rancho é a área de maior incidência em Campo Grande e, a partir desta informação de pesquisa, começou o projeto de extensão.

É de grande importância que o processo de conhecimento e conscientização não se restrinja a mundo acadêmico ou os adultos, mas que envolva também crianças e alunos, pois estes acabam levando a informação a seus lares auxiliando na formação de uma rede básica de atenção primária e comunitária. Desta forma, a população infantil sairá da letargia das comunidades desassistidas e poderá exercer melhor sua cidadania.

LeishNão: O alvo da prevenção é você!


Referências e publicações relacionadas

ACHA, P. N., SZYFRES, B. Visceral Leishmaniasis. In: Zoonoses and Communicable Diseases Common to Man and Animals. Vol. 3, p.86-95. 3ed. Washington, D. C.: Pan American Health Association - PAHO, 2003.
ANTONIALLI, S. A. C.; TORRES, T. G.; PARANHOS-FILHO, A. C.; TOLEZANO, J. E. Spatial analysis of American Visceral Leishmaniasis in Mato Grosso do Sul State, Central Brazil. J. of Infection, v.20, p.1-6, 2006.
BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância Epidemiológica. Manual de vigilância e controle da leishmaniose visceral / Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde, Departamento de Vigilância Epidemiológica. Brasília: Editora do Ministério da Saúde, 2006. 120 p.
BRASIL. Ministério da Saúde. PORTARIA Nº 2.488, DE 21 DE OUTUBRO DE 2011. Aprova a Política Nacional de Atenção Básica, estabelecendo a revisão de diretrizes e normas para a organização da Atenção Básica, para a Estratégia Saúde da Família (ESF) e o Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS). DOU, seção 1 nº.204. Brasília, out. 2011.
BEVILACQUA, P.D., PAIXÃO, H.H., MODENA, C.M., CASTRO, M.C.P.S. Urbanização da leishmaniose visceral em Belo Horizonte. Arquivos Brasileiros de Medicina Veterinária e Zootecnia v.53 n.1 Belo Horizonte fev. 2001.
CAMARGO-NEVES, V. L. F. A Leishmaniose Visceral Americana no Estado de São Paulo: Situação Atual. Boletim Epidemiológico Paulista, a.1, N.6, Jun. 2004. Disponível em: http://www.cve.saude.sp.gov.br/agencia/bepa6_lva.htm. Acesso em 05 out. 2008.
CAMPO GRANDE-MS. Prefeitura Municipal de Campo Grande. Instituto Municipal de Planejamento Urbano. População do Município de Campo Grande por Bairros e Regiões Urbanas - 2007. out. 2008, 130p. Disponível em: http://www.capital.ms.gov.br/egov/downloadFile.php?id=4165&fileField=arquivo_dow&table=downloads&key=id_dow&sigla_sec=sisgran Acesso em: 15 abr. 2012.
CDC - Centers for Disease Control. Epi Info versão 7.0.9.34. Disponível em: http://wwwn.cdc.gov/epiinfo/7/index.htm Acesso em: 12 fev. 2012.
CORTADA, V. M. C. L.; Doval M. E. C.; Souza Lima, M. A. A. et al. Canine Visceral Leishmaniasis in Anastácio, Mato Grosso do Sul State, Brazil. Veterinary Research Communications, Netherlands, v.28, p 365-74, 2004.
DESJEUX, P. Leishmaniasis: current situation and new perspectives. Comp. Immunol. Microbiol. Infect. Diseases. 27(5):305-18, sep 2004.
GONTIJO, C. M. F.; MELO, M. N. Leishmaniose visceral no Brasil: quadro atual, desafios e perspectivas. Revista Brasileira de Epidemiologia. v.7, n.3, p.345, 2004.
HUEB, M; CAMIÁ, R. P.; RIBEIRO, L. C.; FONTES, C. J.F. Calazar em Mato Grosso – Foco Recente em Área Periurbana. Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical 33 (supl 1): 324-325, 2000.
JULIÃO, F.S.; SOUZA, B.M.P.S.; FREITAS, D.S.; OLIVEIRA, L.S.; LARANJEIRA, D.F.; B.J.A.; FRANKE, C.R. Investigação de áreas de risco como metodologia complementar ao controle da leishmaniose visceral canina. Pesquisa Veterinária Brasileira, 27(8):319-324, ago 2007.
MARCELINO, A. P. Leishmaniose visceral e áreas de vulnerabilidade à saúde em Belo Horizonte, 2001-2005. 2007. Dissertação (Mestrado em Medicina Veterinária) – Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte.
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NUNES, V. L. B.; GALATI, E. A. B.; NUNES, D. B. et al. Ocorrência de leishmaniose visceral canina em assentamento agrícola no Estado de Mato Grosso do Sul, Brasil, Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical. São Paulo, v.34, n.3, p.301-02, 2001.
OLIVEIRA, A. L. L.; PANIAGO A. M. M; DORVAL, M. E. C.; OSHIRO, E. T.; LEAL, C. R.; SANCHES, M.; CUNHA, R. V.; BÓIA, M. N. Foco emergente de leishmaniose visceral em Mato Grosso do Sul. Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical, v.39, n.5, p.446-450, 2006.
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VINHAL, L. C.; DOMINGOS, S. L. Interferência do controle químico na redução do número de casos da leishmaniose visceral no Município de Palmas-TO. In. 4ª Mostra Nacional de Experiências Bem-Sucedidas em Epidemiologia, Prevenção e Controle de Doenças. Anais... Brasília: Ministério da Saúde, 2005.
WHO - World Health Organization. Special Programme for Research and Training in Tropical Diseases: TDR news. Data needed on people infected with visceral leishmaniasis: call for expansion of working database. May 2011. Disponível em: http://www.who.int/tdr/news/2011/vl-working-database/en/ Acesso em: 13 Mai. 2012.
WHO - World Health Organization. Neglected Tropical Diseases. WHO and Gilead sign agreement for enhanced access to visceral leishmaniasis treatment. Dec. 2011. Disponível em: http://www.who.int/neglected_diseases/Gilead_donation_2011/en/ Acesso em: 13 Mai. 2012.
WHO - World Health Organization. International Travel and Health: Disease Information. Leishmaniasis (cutaneous, mucosal and visceral forms). Disponível em: http://www.who.int/ith/diseases/leishmaniasis/en/ Acesso em: 13 Mai. 2012.





Um comentário:

  1. O blog ficou muito legal!! E o texto está altamente explicativo.
    É isso aí, vamos conscientizar a população sobre a gravidade desta doença e a importância do nosso projeto!
    LeishNão!!!!!!
    ;)

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